Além da Colômbia que, conforme revelou despacho de 2004 vazado pelo Wikileaks, reclamou com os Estados Unidos sobre um suposto “imperialismo brasileiro” na América do Sul, a ex-ministra de Relações Exteriores do Paraguai, Leila Rachid, foi outra autoridade que buscou auxílio da diplomacia norte-americana contra a política externa brasileira, em uma reunião com o embaixador dos EUA em Assunção, em 21 de abril de 2005.
Leila Rachid foi chanceler entre 2003 e 2006, durante o governo do colorado Nicanor Duarte Frutos. Duarte foi o último presidente do Partido Conservador, que dominou a política paraguaia por seis décadas, até a vitória eleitoral do progressista Fernando Lugo, em 2008. Considerado um aliado próximo dos EUA, o paraguaio chegou a permitir a presença de tropas norte-americanas no país até 2006, como parte de um acordo de cooperação militar com os EUA.
Na época da reunião descrita no documento, o Paraguai estava atuando como presidente do Mercosul, e por isso havia emitido um comunicado conclamando o Equador a “preservar a democracia” diante do caos. No dia 20 de abril, o presidente equatoriano Lucio Gutierrez fora destituído pelo Congresso após ter perdido o apoio das Forças Armadas em meio a protestos populares.
O comunicado do Mercosul evocava as diretrizes da recém-criada Comunidade Sul-Americana de Nações (que depois se tornaria a atual Unasul – União de Nações Sul-Americanas). Segundo disse Leila Rachid ao embaixador norte-americano, a observação foi resultado da insistência do ex-chanceler brasileiro Celso Amorim, que preferiu a Unasul em vez da Carta Democrática Interamericana.
Ela explicou que se opôs à ideia porque a Comunidade Sul-Americana de Nações “é meramente um brilhozinho nos olhos a essa altura; foi anunciada como uma proposta no ano passado, mas falta estrutura, um conjunto de princípios acordados pelos membros e outras características normais de ‘institucionalização’”. Segundo o despacho, Amorim teria dito que citar a carta Interamericana seria um convite aos EUA para “interferir” em questões regionais, que, para o Brasil, deveriam ser cuidadas apenas pelos países sul-americanos.
O documento prossegue: “Ela fez um comentário pessoal [dizendo] que Amorim está empurrando uma agenda para minimizar a influência dos EUA na América do Sul e afirmar o domínio brasileiro, uma direção que ela se opõe fortemente porque se traduz em controle irrestrito do Brasil sobre o destino do Paraguai”, diz o despacho.
Um mês depois, em 13 de maio, Leila seria ainda mais explícita. Ela compareceu a outra reunião com o embaixador norte-americano John F. Keane para tratar do congresso ministerial da OEA (Organização dos Estados Americanos) e a possibilidade de assinar o Artigo 98 – segundo o qual o Paraguai se comprometeria a não extraditar cidadãos norte-americanos ao Tribunal Penal Internacional.
Nessa reunião, Rachid não poderia ser mais clara: pediu um encontro com a secretária de Estado Condolezza Rice sobre a atitude comercial brasileira e a política externa. “Ela reclamou que o Brasil havia cortado cotas de exportações paraguaias”, relata o documento. “Ela também estava preocupada com a ambição brasileira de se tornar a maior liderança política na região e instou que os EUA se afirmassem para se opor ao Brasil”.
Curioso como essas Repúblicas sulamericanas têm os Estados Unidos como seus donos. Já está no imaginário.